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Parte Dois – O Outro Monte

Parte Dois – O Outro Monte

Sibéria, 13 de dezembro de 2060.

Andreiev Melochenko[1]


Era um tradicional domingo carioca. Praia e sol arrefeciam os anos de chumbo. Dois ébrios torcedores flamenguistas discutiam o potente chute do ‘nove’ Cláudio Adão e o pênalti cobrado por Tita, ambos defendidos pelo goleiro Mazzaropi na decisão do campeonato. Os americanos, que não gostavam do soccer, apreciavam a paisagem que estampava o Morro da Urca; combinavam uma cerveja depois do encontro marcado para as 22 horas. Mr. More transpirava mais do que a temperatura recomendava; demonstrava um certo nervosismo antes da exposição na Fortaleza São João, sede da Escola Superior de Guerra. O general Olívio Mougão, em trajes civis, estacionou o Ford Corcel I sob o jambeiro na hora marcada para o encontro com os agentes yankees. O oficial descansadamente fechou a ventarola, bateu delicadamente a porta, cumprimentaram-se como velhos conhecidos; e dirigiram-se para um porão bastante reservado. O ambiente era úmido, as paredes apresentavam manchas de mofo; Mr. More não deixou de perceber um viscoso líquido avermelhado no canto da sala. Um inquieto camundongo aguardava o final do encontro. O oficial escutou atentamente a palestra. Deu a partida no motor do Corcel, arrancou bruscamente deixando as marcas de derrapagem no asfalto; seguiu pelas avenidas escutando Agnaldo Timóteo. Não conseguia parar de pensar no SHIT B, era muito diferente das tradicionais operações psicológicas que até então conhecia nas Forças Armadas. Os americanos tomaram um táxi até um night club barato. Foram recepcionados por uma morena de lábios fumegantes, “Mister, buy me a drink”, sussurrou lascivamente no ouvido do mais jovem. O americano não compreendeu o pedido da dançarina.  Sentaram-se no sofá e tomaram meia-dúzia de Brahmas. O quarteto contentou-se com alguns minutos de strip-tease. Como ainda não estavam embriagados, deixaram o sexo de lado, Mr. More, apesar dos goles de cerveja e dos carinhos, não removia o gélido semblante. Pagaram a conta em dólares; a morena foi recompensada com o troco depositado no interior da rendada calcinha cor de carmim. Apertaram-se num Chevette azul chamado pelo brutamontes que fazia a segurança, retornaram à pensão para a produção do relatório e planejamento da próxima etapa da missão. O general Mougão telefonou numa terça-feira chuvosa para a espelunca e conversou rapidamente com Mr. More. “Yes, tomorrow”. Os americanos entreolharam-se sem trocar uma única palavra; partiram naquela tarde. O general da S2 morreu no dia seguinte e a causa mortis lançada na certidão de óbito indicava trombose coronária, em que pese o oficial jamais ter apresentado patologia cardiovascular, conforme demonstra a Ficha de Inspeção Sanitária do Hospital de Guarnição.  

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[1] Andrey Régis de Melo

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