Cind Canuto

Cometi uma morte

“Cometemos a maioria das nossas ações”. Que ela quis dizer com isso?

Verifiques primeiramente se estou morta mesmo. Sim? Por favor, novamente. Ótimo, agora que estou bem morta, pense cá comigo, como poderia eu ainda pensar depois de morta? Ora, se não há plano, nem projeto, nem sabedoria alguma no além? (para onde vais, não te esqueças).

Foi minha mãe que me encontrou com cigarros, na sarjeta, e com o filho do vizinho em pleno ato, e me perdoou os delitos. O perdão é o que concebe a culpa, não negues. Então, eu tive perdão e, consequentemente, culpa. Já vivi de tudo, dizia minha culpa, a que alguns chamam consciência.

Outra vez eu disse que queria ser minha sombra, pois seria tão mais simples ter apenas duas dimensões e ser monocromática. Ao que ela respondeu: “Imagine o que sua alma sente quanto ao seu corpo”. Esses momentos de sabedoria dela me tiravam do lugar. Agora eu tenho certeza, foram os lampejos de idéias de mamãe que me levaram ao suicídio.

Ela talvez quisesse dizer que algumas ações não somos nós que as cometemos, só a maioria. Ou que as ações fossem cometidas porque tínhamos escolha no momento da ação, e a escolha é feita de forma geral irrefletidamente. No primeiro caso, pensar na ação das influências nas nossas ações poderia ter sido feito por qualquer estudo sociológico. No segundo, caberia uma discussão do uso comum da inteligência concreta pelo homem, em vez da abstração.

Porém eu pensava agora na culpa que eu sentia, a tal que tinha me feito cometer – e não proceder, ou simplesmente fazer, cometer – a maioria das minhas ações. Inclusive a última, que me foi fatal, e que agora ela comenta no meu leito de morte. Por que só agora me atinei para minha culpa? Não quero desmerecer a morte, depois da qual o raciocínio se desenrolou, mas antes ela me tivesse dito isso antes!

 Cind Canuto

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